Esquemas como o desvendado pela PF mostram que a corrupção na saúde pública brasileira não é exceção, é sintoma de um sistema fragilizado e convenientemente ignorado.
O recente escândalo envolvendo a fraude no programa Farmácia Popular, com quase R$ 40 milhões desviados por uma rede de farmácias fantasmas, não é um caso isolado. Pelo contrário, ele é apenas a ponta de um iceberg que se esconde sob as águas profundas e turvas da gestão do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil.
Enquanto a Polícia Federal investiga organizações criminosas que utilizam CPFs de inocentes e empresas de fachada para fraudar a compra de medicamentos subsidiados, milhões de reais continuam sendo desviados todos os meses em outras frentes do SUS, isso sem alarde, sem manchetes, e pior: sem resposta.
A lista de mecanismos fraudulentos é extensa:
- Superfaturamento de contratos com laboratórios e fornecedores;
- Clínicas conveniadas que recebem sem prestar atendimento;
- Marcação de procedimentos inexistentes no sistema para inflar repasses;
- Falsificação de laudos para obtenção indevida de benefícios;
- Repasse de recursos federais sem contrapartida municipal;
- Pagamento de horas extras fictícias em hospitais públicos.
Tudo isso compõe uma rede de corrupção silenciosa que se alimenta da fragilidade dos sistemas de controle e da ausência de fiscalização ativa. Em 2023, um levantamento do TCU apontou que mais de R$ 2,5 bilhões em recursos do SUS apresentavam indícios de irregularidades graves. E esse é só o valor detectado, mas o rombo invisível é muito maior.

O SUS é, sem dúvida, uma das maiores conquistas da sociedade brasileira. Mas ele também virou terreno fértil para desmandos administrativos, fraudes institucionais e corrupção entranhada. E, em muitos casos, o problema não está apenas nas gestões locais, mas na conivência política e no silêncio na cúmplicidade de quem deveria fiscalizar.

A sociedade, distraída com escândalos episódicos e polarizações vazias, segue sem cobrar mudanças estruturais. Enquanto isso, a fila do exame cresce, o remédio falta, o médico atrasa e o dinheiro escorre, some literalmente.
É hora de parar de tratar os escândalos como exceção. Eles são, infelizmente, parte de um sistema doente. E não há reforma tributária, PEC do Teto ou plano de investimento que sobreviva à corrupção silenciosa que esvazia diariamente o que é de todos.
Fonte: RHC