Decisão adia definição sobre a licitude da contratação de trabalhadores via pessoa jurídica e divide opiniões entre modernização e precarização
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu suspender o julgamento do Tema de Repercussão Geral 1389, que trata da licitude da pejotização, contratação de trabalhadores como pessoa jurídica ou autônomos. A decisão, proferida pelo ministro Gilmar Mendes, paralisa processos semelhantes em todo o país até que a Corte fixe uma tese definitiva. O tema divide opiniões e deve se tornar um dos marcos da relação entre capital e trabalho no Brasil.
A pejotização ocorre quando um profissional formaliza contrato como pessoa jurídica, mas atua em condições que, na prática, se assemelham a uma relação de emprego celetista. Empresas veem na modalidade uma alternativa para reduzir encargos trabalhistas e ganhar flexibilidade, enquanto críticos apontam riscos de precarização e perda de direitos.
Argumentos contrários
Advogados trabalhistas e entidades sindicais alertam que a pejotização pode fragilizar a rede de proteção social. Sem vínculo empregatício, trabalhadores ficam sem direitos como férias, 13º salário, FGTS e estabilidade contra demissão arbitrária. Há também impacto direto sobre o sistema previdenciário, com menos contribuições ao INSS, a sustentabilidade de aposentadorias e benefícios sociais é ameaçada. Outro ponto é o enfraquecimento da representação sindical, já que negociações coletivas deixam de ter efeito sobre trabalhadores contratados como PJ.
Em petição à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), o advogado Christovam Ramos Pinto Neto classificou a pejotização como “violação estrutural de direitos humanos”, destacando prejuízos não só aos trabalhadores, mas também à arrecadação pública e a setores como saúde, comércio e construção civil.
Argumentos favoráveis
Do outro lado, representantes empresariais defendem a pejotização como reflexo da modernização das relações de trabalho. Para a FecomercioSP, a legislação atual não acompanha a diversidade de formatos existentes na economia contemporânea, marcada pela atuação de profissionais autônomos, consultores e prestadores de serviço em múltiplas empresas. A flexibilização, segundo esse grupo, amplia a competitividade das empresas, reduz litígios e pode gerar novas oportunidades de ocupação.
Há ainda quem veja na pejotização uma forma de autonomia para profissionais “hipersuficientes”, aqueles de alta qualificação e remuneração, que preferem negociar diretamente com contratantes, fora das amarras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Motoristas de aplicativos e novas fronteiras
O debate ganha contornos ainda mais complexos com o avanço da chamada “uberização”. Motoristas e entregadores têm recorrido à Justiça para buscar direitos trabalhistas, argumentando que, apesar de se registrarem como autônomos ou MEIs, vivem relações de subordinação às plataformas. Embora esses casos sejam tratados em outro processo (Tema 1291), a decisão do STF sobre pejotização pode influenciar diretamente na regulamentação do setor.
O que está em jogo
O Supremo deverá responder a três questões centrais:
- A licitude da contratação via PJ em atividades com características de vínculo.
- O órgão competente para julgar fraudes contratuais, Justiça do Trabalho ou Justiça comum.
- O ônus da prova em disputas sobre vínculo empregatício. De quem é a responsabilidade de comprovar fraude ou autonomia.
Enquanto o julgamento não ocorre, empresas e trabalhadores seguem em ambiente de insegurança jurídica. Se o STF validar a prática sem restrições, o risco é a expansão de contratos precários em larga escala. Por outro lado, uma decisão mais rígida pode aumentar custos para empresas e reduzir a oferta de postos de trabalho formais.
Por Hosa Freitas
Jornalista, consultora e especialista em comunicação institucional.
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