A nota do Tribunal de Contas aponta sinal vermelho devido à incerteza de quanto o governo arrecada com as negociações especiais feitas no Carf

A matéria do Jornal “A Folha de São Paulo” mostra a preocupação, não só de técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre arrecadação, mas também com a falta de informações do governo federal.
Brasília: A área técnica do TCU (Tribunal de Contas da União) prepara uma nota com alerta ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o risco de descumprimento da meta fiscal de déficit zero neste ano.
A razão é a incerteza em relação à arrecadação decorrente da negociação especial dos contribuintes derrotados pelo voto de desempate nos julgamentos do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), segundo pessoas a par do tema ouvidas pela Folha.
O alerta deverá ter como alvo o fato de o governo ter incluído no terceiro relatório bimestral de avaliação de receitas do Orçamento a previsão de uma entrada de R$ 37,7 bilhões nos cofres públicos, mesmo diante da baixa arrecadação até aquele momento com o Carf.
O relatório bimestral foi encaminhado ao Congresso no dia 22 de julho e serviu de base para o congelamento de R$ 15 bilhões de despesas do Orçamento.
Se tivesse previsto uma arrecadação mais realista com os julgamentos do Carf, o governo teria que ter feito um contingenciamento maior em julho para evitar o risco de estouro da meta.
Os relatórios bimestrais fazem parte das regras da política fiscal e têm a função de balizar a necessidade de contingenciamento e bloqueio a serem adotados pelo governo para garantir o cumprimento da meta fiscal e do arcabouço. Os técnicos do TCU avaliam como perigoso o risco de projeções de receitas superestimadas.
A preocupação é que o governo Lula trabalha com pouca margem de segurança para acomodar frustrações com a arrecadação de receitas como a do Carf, uma vez que mira o limite inferior da meta fiscal.
Essa receita está na conta devido à reintrodução do voto de desempate no Carf, prevista em lei aprovada no ano passado. Os empates nas decisões do Carf, que antes eram automaticamente favoráveis ao contribuinte, passaram a ser decididos pelo voto de desempate. A mudança tende a elevar o número de decisões favoráveis ao governo, mas quase nada entrou no caixa.
Para ser disparado, o alerta tem que ser validado por despacho do ministro relator, Jhonatan de Jesus, ou no plenário do órgão. Uma vez aceito, uma cópia do despacho será enviada para Casa Civil, Fazenda, Planejamento e Orçamento, CGU (Controladoria-Geral da União) e à Comissão Mista de Orçamento do Congresso. A nota técnica aguarda deliberação do gabinete do ministro relator.
Diligências feitas pelos técnicos do TCU na Receita Federal apontaram que os valores arrecadados do Carf seguem em níveis abaixo de 1% do previsto. Um dos problemas já relatados publicamente pelo secretário da Receita, Robinson Barreirinhas, é que a arrecadação do Carf começou tardiamente devido ao intervalo entre o julgamento, a liquidação do acórdão, a notificação e o prazo para regularização. Esse processo não foi considerado nas projeções.
Em agosto, o TCU já havia alertado para o risco de o governo ter elaborado projeções otimistas demais para o projeto de Orçamento de 2025, que foi enviado dias depois ao Congresso.
Para os técnicos, não se trata apenas do risco de estouro da meta, mas de tentativa de uso de subterfúgios para driblar as regras com previsões pouco realistas.
Técnicos do TCU também veem com preocupação o projeto de lei do governo para aumentar o Auxílio-Gás, que prevê um repasse direto de recursos do pré-sal para a Caixa Econômica Federal sem passar pelo Orçamento, em operação vista por especialistas como drible no arcabouço.
Por ser projeto de lei ainda não aprovado pelo Congresso, por enquanto, a avaliação é que não há que fazer. Para os técnicos, o projeto representa um retrocesso na transparência do Orçamento.
Fonte: Folha de São Paulo/TCU