Terras raras no Brasil: A mineradora dos EUA e o desafio da China na busca por autonomia

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Única operação em larga escala, a Serra Verde Mineração, de capital estrangeiro, enfrenta gargalos técnicos e econômicos para alavancar a produção e competir em um mercado dominado pela China, enquanto o Brasil busca agregar valor.

O Brasil já tem sua mineradora de terras raras em operação, a Serra Verde Mineração, localizada em Minaçu, no norte de Goiás. Desde o ano passado, a empresa tem exportado sua produção, e o primeiro semestre de 2025 registrou um aumento impressionante de quase 700% nas vendas desses elementos vitais para a tecnologia moderna. A novidade ganha ainda mais relevância após o embaixador interino dos EUA, Gabriel Escobar, sinalizar o grande interesse americano pelos minerais críticos brasileiros, incluindo as terras raras.

No entanto, a realidade por trás da operação da Serra Verde é complexa e repleta de desafios, evidenciando a hegemonia chinesa e a árdua jornada do Brasil para se posicionar de forma estratégica nesse mercado global.

A Questão da Propriedade e o Domínio Chinês

A Serra Verde é controlada por fundos de investimento americanos e britânicos, que veem a operação brasileira como uma alternativa crucial para reduzir a dependência da China. A gigante asiática, por sua vez, domina mais de 90% de todo o mercado de terras raras, desde a extração até o complexo processo de refino e a fabricação de produtos finais.

A mineradora goiana tem planos ambiciosos de produzir 5.000 toneladas anuais de óxido contido em concentrado de terras raras, focando nos quatro elementos magnéticos críticos (neodímio, praseodímio, térbio e disprósio) – uma produção inédita fora da China para esses materiais. Contudo, apesar do controle ocidental da Serra Verde, a maior parte das exportações brasileiras deste ano teve um destino singular: a própria China. Isso ocorre porque o país asiático detém a vasta maioria das refinarias globais, essenciais para transformar o concentrado bruto em óxidos purificados, o material de fato utilizado na fabricação de ímãs para veículos elétricos, painéis solares e tecnologias de defesa.

Por ora, a Serra Verde se especializa na fase de concentração, transformando um mineral com teor de 0,1% em um concentrado de aproximadamente 30%, que é o material exportado.

Desafios no Pioneirismo e a Pressão dos Preços

Apesar do pioneirismo, a operação da Serra Verde não tem sido isenta de obstáculos. Fontes próximas à empresa, que não tem ações listadas em Bolsa e, portanto, não é obrigada a divulgar detalhes de suas operações, confirmaram que a produção foi temporariamente suspensa. O motivo são dificuldades técnicas não previstas no processo de concentração dos elementos. A Serra Verde é a primeira a extrair terras raras fora da Ásia das chamadas argilas iônicas, um método que, apesar de promissor, traz complexidades na escala industrial. Rafael Marchi, sócio da Alvarez & Marsal, consultoria que presta serviços à mineradora, estima que o período de otimização do processo deve durar entre 12 e 18 meses.

Além dos desafios operacionais, a viabilidade econômica é uma barreira significativa. A Serra Verde vendeu cada quilo do seu concentrado por uma média de US$ 14 neste ano, valor estipulado em contratos pré-operação. Contudo, para se tornar rentável, a empresa precisaria vender a US$ 25, idealmente US$ 40 por quilo. O grande entrave é o preço de mercado global, com a Shanghai Metal Markets apontando o concentrado de terras raras por cerca de US$ 5. Especialistas explicam que as empresas chinesas, por controlarem toda a cadeia produtiva, conseguem repassar custos e praticar preços muito mais baixos, tornando a competição desigual.

A Busca por Agregação de Valor e a Posição Estratégica do Brasil

Diante desse cenário, o grande desafio para o Brasil é ir além da simples exportação de minério bruto e agregar valor à sua produção. O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) já demonstra interesse nessa verticalização e selecionou a Serra Verde para participar de um projeto de crédito a empresas de metais críticos, cujos detalhes ainda não foram divulgados.

Outras iniciativas, como o programa liderado pela FIEMG (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais) e o Senai em Minas Gerais, buscam desenvolver a fabricação de ímãs permanentes de Neodímio em larga escala no país, com apoio do governo federal. O objetivo é claro: transformar o Brasil de mero exportador de commodity em exportador de tecnologia.

Especialistas, como Fernando Landgraf da USP, apontam que a posição do Brasil, detentor da segunda maior reserva de terras raras do mundo e com uma mineradora de capital americano em operação, pode ser uma carta poderosa em futuras negociações com os EUA, especialmente em um contexto de guerra comercial ou imposição de tarifas, como as propostas por Donald Trump.

Apesar dos obstáculos técnicos e econômicos, o caso da Serra Verde Mineração ilustra o potencial do Brasil no fornecimento de minerais estratégicos, mas também a complexidade de se consolidar em um mercado global dominado por uma única potência. O futuro da cadeia de terras raras no país dependerá da superação desses desafios e da capacidade de transformar o minério em produtos de maior valor agregado.

Fonte: RHC

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